Algumas coisas às vezes (e escrevendo isso me dei conta que, como Gessinger, “às vezes nunca sei se ‘às vezes’ leva crase”) ficam martelando em nossas cabeças, lembranças, músicas (ruim quando essa música é o Rebolation ou Ela Sai de Saia de Bicicletinha), frases... Nos últimos dias uma frase fez isso comigo, e em diversos momentos me vi pensando nela, “Combati o bom combate, completei a corrida, guardei a fé”, autoria atribuída pelas Sagradas Escrituras ao apóstolo Paulo (II Timóteo 4,7). Digo autoria atribuída pelo fato de que podemos questionar se este texto realmente é de autoria de Paulo. Biblistas apontam diferenças consideráveis entre esta e as outras cartas paulinas, de todo modo, quem escreveu a carta, se não foi o próprio Paulo, colocou-se na pele dele.
Coincidentemente, ou talvez não (destino ou providência divina?), a liturgia da palavra do último domingo apresentou-me este texto. Como a proposta deste escrito não é, ainda, falar sobre fé, deixemos um pouco de lado o “guardei a fé” e fiquemos com a metáfora esportiva “combati um bom combate, completei a corrida”.
Há muito, mas não tão muito, tempo atrás, ainda em minha adolescência, por reiteradas vezes eu sonhei acordado com um fato curioso, minha imaginação me levava ao meu próprio funeral e eu ficava a fantasiar quem estaria presente, quem choraria, quem ficaria indiferente, quem faria as homenagens, tentando assim refletir sobre minha importância para os outros.
Todos, um dia, até mesmo aqueles que acreditam em arrebatamento sem morte (que estes não me ouçam), irão encontrar-se com esse “único mal irremediável”, afinal, a vida passa em dois piscares de olhos, não em um, pois assim seria injusto, mas em dois, porque no intervalo entre um e outro devemos olhar para trás e realmente perceber que a vida é assim (abaixo coloco uma publicidade que ilustra bem o que eu estou dizendo). Sim, voltando ao raciocínio, o quão bom seria chegar ao final e poder dizer como Paulo “combati um bom combate, completei a corrida”, o autor sagrado, ao escrever isso, afirma que completou seu objetivo e foi fiel à sua causa e, por isso, sabendo que vem chegando o fim, obteve sucesso e realização pessoal naquilo que se propôs a fazer.
O autor percorreu um caminho, daí o “completei a corrida”, e, segundo a história, não fora um caminho dos mais fáceis, mas ele completou. O autor não fala que foi vencedor, mas apenas que completou, não fala que destruiu o adversário, mas apenas que combateu bem.
Analisemos as nossas vidas, é verdade que o nosso sucesso nada mais é que o insucesso de alguém? Se eu saí vitorioso, em regra alguém saiu derrotado, se eu ganhei um bom emprego, provavelmente alguém o perdeu, se eu passei e fiquei com a vaga, de fato, alguém reprovou e a perdeu. E nossas realizações, será que não seguem o mesmo raciocínio.
Todos correm sua corrida e travam seu combate, todos teremos um final, e o que diríamos ou diremos ao mundo se pudéssemos ou pudermos escrever uma carta como a de Paulo? Obtivemos sucesso e realização pessoal? Mas sucesso e realização pessoal em que? A custa de que? Qual nosso objetivo e a quem somos fieis? Será que esquecemos do outro?
Não pretendo dar conselhos ou escrever textos de auto-ajuda, afinal sou um protótipo de filósofo, mas acredito que devemos questionar diariamente nossas vidas, se somos quem queremos ser ou aquilo que querem que nós sejamos, se nosso objetivo é bom ou mesmo se existe um objetivo, se somos fiel a algo ou alguém.
Saramago também escreveu algo antes de morrer, nada tão bom como o que escreveu Paulo antes da sua (particularmente não acho que Saramago escreveu qualquer coisa tão boa quanto Paulo, mas tem seus méritos e merece respeito), o lusitano questionou a inércia no pensar em seu último post no blog Outro Caderno (http://caderno.josesaramago.org) dizendo que: "Acho que na sociedade actual nos falta filosofia. Filosofia como espaço, lugar, método de reflexão, que pode não ter um objectivo determinado, como a ciência, que avança para satisfazer objectivos. Falta-nos reflexão, pensar, precisamos do trabalho de pensar, e parece-me que, sem ideias, não vamos a parte nenhuma".
Devemos, também nós, questionar e encontrar nossas próprias respostas.
Na verdade não sei o que quis dizer com tudo isso, não sei nem mesmo se quis dizer alguma coisa, digam vocês, mas parece ser hora de repensar se o sucesso individual vale a derrota coletiva. Combater é bom e necessário, mas creio que desnecessários são os perdedores.
Estou correndo, estou combatendo, para mim ainda falta muito. Abaixo o vídeo do qual eu falei.
Aflições, para mim um dos grandes motivos da tristeza humana, pois enquanto se está aflito por qualquer coisa pequena ou grande não se consegue felicidade plena então porque me afingir, porque me preocupar com um futuro incerto, perigoso, que não se pode prever, se combati ou não o bom combate, sem levar em conta fé ou dogmas, não deve ser algo para preocupação, pois enquanto me preocupo, deixo de viver e aproveitar o momento único que é a vida, após esta não se tem outra, não levo em conta os pensamentos "espíritas" aqui e também os pensamentos sobre "ressurreição", hoje dentro do que estou sendo, posso mudar a qualquer momento, procuro sem preocupação o modo de viver baseado no "Carpe Diem", com isso deixo de pensar no futuro e vivo o presente e deixo qualquer aflição para ser vivida quando for a sua hora.
ResponderExcluirQuanto ao sucesso em detrimento do coletivo, não vejo saída, não há vagas para todos, somente os merecedores, os melhores vencem, uma hora vencem outra hora perdem, até mesmo para dogmas de salvação, há uma seleção, nem todos irão para o céu ou qualquer coisa parecida, somente os que se adequam ao modo de viver anunciado por algumas religiões.
O homem é competitivo, a vida é competitiva, tudo é competição, mudar isso creio que não seja necessário, pois ao se manter a competição, mantém-se a qualidade, a própria natureza na fauna e flora faz esta seleção e não estamos livres dela.
Mas a melhor forma ainda é não se preocupar é deixar o rio correr e ao invés de tentar fazer barragens humanas para contê-lo, devemos deixar-nos conduzir e nos direcionarmos de acordo com a correnteza, dá mais resultado.
Aflição gera insatisfação que gera tristeza.
Posicionamento gera certeza que gera satisfação que gera felicidade.
muuito bom Clovis!!
ResponderExcluirJúnior, gostei muito do texto.
ResponderExcluirAcho que a frase de Paulo e a de Saramago, realmente, nos remetem à simples, porém necessária, ação de reflexão, de pensar antes de agir. E se é tão importante nos nossos pequenos atos diários, mais importante se faz nos "combates" que travamos em nossa vida. Costumo dizer que pensar (refletir) muda uma ação antes definida.